Argumento 1. A Educação
Domiciliar atenta contra o estabelecido na Constituição e nas Leis Nacionais da
Educação.
A prática da educação
domiciliar é uma realidade em diversos países do mundo. Também no Brasil. Em
alguns países já existe uma legislação pertinente para essa prática. No Brasil,
ainda temos um vazio na legislação ao respeito. Assim, se a prática existe e um
numero de famílias cada vez maior faz essa opção, torna-se improrrogável
definir o status legal dessa prática.
O debate está por tanto, em
aberto. E já se escutam vocês a favor e em contra do Projeto de Lei que o
Deputado Lincoln Portela do PR, deve apresentar à Câmara de Deputados para sua
votação.
Nos últimos anos outros
projetos de Lei foram arquivados, sem chegar a ter o devido debate. Tramitaram na Câmara dos Deputados,
desde 2008, os Projetos de Lei (PL) 3518/2008, de autoria dos
Deputados Henrique Afonso (PT-AC) e Miguel Martini (PHS-MG), e 4122/2008,
de autoria do Dep. Walter Brito Neto (PRB-PB). O parecer dos relatores
do projeto foi suficiente para destruir essas iniciativas. Em junho de 2009, a então
deputada relatora, Bel Mesquita (PMDB-PA), apresentou à Comissão de Educação e Cultura
- CEC um relatório propondo a rejeição dos projetos sobre homeschooling,
alegando que eles violariam a Constituição e as leis brasileiras, que a
socialização escolar é imprescindível e que há países desenvolvidos que proíbem
ou restringem o ensino domiciliar.
Um mês depois (em julho de 2009), o Dep. Lobbe Neto
(PSDB-SP) sugeriu à CEC que, antes que ela tomasse alguma decisão acerca do
relatório da Dep. Bel Mesquita e dos projetos sob análise, fosse realizada uma audiência
pública, na qual a CEC convidaria especialistas no assunto a apresentarem
palestras e discutirem o tema perante a Comissão. Essa audiência de fato foi
realizada em outubro de 2009. Em conseqüência dessa audiência, o deputado que a
presidiu, Wilson Picler (PDT-PR), convenceu-se do mérito do ensino domiciliar e
preparou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) destinada a consagrar na
Constituição Federal o direito ao ensino domiciliar. Ele conseguiu o apoio de
dezenas de outros deputados para apresentar essa proposta. Trata-se da PEC
444/2009, que também está tramitando no Congresso.
Depois dessa audiência pública, a tramitação dos PLs na CEC da Câmara parou por um longo tempo. O relatório da Dep. Bel Mesquita foi arquivado sem ser votado. Em 15/09/2011, o novo relator, o Dep. Waldir Maranhão (PP-MA), apresentou um novo relatório à CEC sobre esses projetos. E esse segundo relatório também recomendou a rejeição dos dois projetos, com base em argumentos idênticos aos da antiga relatora Bel Mesquita. Esse relatório ainda não foi votado pela CEC.
O que resulta agora interessante é perceber que as vozes que se levantam contra o novo PL, já começam a usar os mesmos argumentos que foram utilizados no passado.
Mas, quais são esses
argumentos? Em que consiste o seu valor? São realmente incontestáveis?
Argumento 1. A Educação Domiciliar atenta contra o estabelecido na Constituição e nas Leis Nacionais da Educação.
O que a Constituição brasileira explicita no artigo
205 é que, “A educação, (é) direito de todos e dever
do Estado e da família”. No
artigo 209 se lê que ”O ensino é
livre à iniciativa privada,
atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação
nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo poder público e no Artigo 210 que “Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino
fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e
artísticos, nacionais e regionais.
Em consonância a esses princípios constitucionais, a Lei no 9.394, de 20
de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional
(LDB), art. 23, caput,
dispõe que, “A educação básica poderá organizar-se em
séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de
estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros
critérios, ou por forma diversa de
organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o
recomendar”.
Quais desses elementos não são cumpridos efetivamente
pela Educação Domiciliar? Em
primeiro lugar quando uma família opta pela educação domiciliar, está de fato
assumindo do dever de dar educação aos
seus filhos. O que está fazendo é
optando por uma modalidade de ensino privado, tal como fica explícito na
Constituição. Tal decisão não
retira nem diminui o dever do Estado de garantir o Direito de uma criança
educada domiciliarmente à educação. O que deve ocorrer é que o Estado defina instâncias
específicas para que possa cuidar pertinentemente das crianças que vivem sua
educação nessa modalidade.
A LDB, deixa claro que a educação básica segue séries,
períodos, ciclos, faixa etária.
Que são os critérios com os quais se estrutura a educação escolar. Porém,
também menciona a possibilidade de
uma forma diversa de organização, sempre
que o processo de aprendizagem assim o recomendar. Bem, a educação domiciliar, centrada no
processo de aprendizagem da criança apresenta de fato, uma forma diversa de
organização.
Quando a Constituição chama atenção para o cumprimento
de conteúdos, faz questão de usar a
palavra mínimos. O que significa que
é licito e possível uma diversidade de percursos (que é o que ocorre na Educação
Domiciliar), sempre que se garanta
o respeito aos valores
culturais e artísticos, nacionais e regionais”.
A rigor, não seria
necessária uma Lei, a não ser para evitar interpretações erradas do que já
existe na Constituição e na LDB. Falta sim, regulamentar isso. Por exemplo, seria necessário desdobrar
os alcances do “dever” das famílias.
Também seria importante definir por exemplo, se acaso seja necessária a existência de instituições
privadas especializadas em atender crianças em regime domiciliar. Como as que
existem na Europa ou nos Estados Unidos, cuja função seria orientar
epistemologicamente e juridicamente
às famílias e às crianças na experiência que estão vivendo, fornecer todo o
processo de registro, memória, avaliação e de certificação de suas atividades e
responder por esse processo diante das autoridades competentes. Essas
instituições funcionam praticamente como já funcionam empresas que oferecem
ensino a distancia no Brasil.
No entanto, o Estado pode
sim vir a brindar esse serviço, quando se trate de famílias de baixos recursos
que, querendo optar pela educação domiciliar, não disponham de dinheiro
suficiente para pagar uma instituição privada. Os programas de Educação a Distancia do Estado, canais de
televisão e rádio públicos, além
de programas de inclusão digital podem, como de fato já acontece, ser uma estrutura pertinente de apoio, em
todos os sentidos, para criança educadas domiciliarmente, tanto nas cidades
como no campo. Para essas famílias, pode ser de grande valia, contar com apoio
público a través, por exemplo, de um ator que poderia ser chamado de “Agente de
Educação Comunitária”. Este, da mesma maneira que o Agente Comunitário de
Saúde, pode visitar regularmente famílias e orientar, facilitar ou até,
encaminhar a criança a serviços
públicos que atendam dificuldades de aprendizagem, a bibliotecas
públicas, a centros de inclusão digital, a grupos de pesquisa nas universidades
públicas, etc.
E se mesmo com estes
esclarecimentos ainda tem gente que acha que o Ensino Domiciliar fere a
Constituição e as Leis vigentes?
Então cabe sim, mudar a
Constituição e as Leis de maneira a adaptá-las às demandas das famílias que
preferem uma outra modalidade de educação. Teremos que ampliar a Constituição e
a Lei se é isso que falta, toda vez que as famílias não se propõem a cometer
delitos, mais a cumprir com o que entendem ser de mais importante em relação
com seus filhos, que é garantir uma educação de qualidade. Teremos então que lembrar que as Leis
são instrumentos a favor dos interesses cidadãos, e não apenas de maiorias, também de minorias que entendem de
maneira singular alguns processos, como é o processo de educar os filhos.
Teremos que lembrar que as leis não são eternas e nem inamovíveis, mas feitas
pelos diversos movimentos humanos e processos históricos. Se até 1988 a
Educação Domiciliar não estava no horizonte histórico dos legisladores
brasileiros, deve ser incorporada ao horizonte histórico dos atuais.
Ha mais a ser pensado. A
Educação Domiciliar também pode ser uma solução para mais de 2 milhões de
adolescentes brasileiros que não se adaptaram ao ensino escolar tradicional.
São jovens que não tem alternativa, porque tudo que encontram é o caminho de
volta para a o sistema escolar ao
qual não se adaptaram. Uma
política Pública responsável encontraria caminhos para que estes jovens possam
reencontrar o caminho da educação desde seus lares. Se dirá que muitos desses
lares não existem ou estão desestruturados. Então que encontrem a educação
desde se mesmos e de seu desejo de fazer parte do mundo. Da mesma maneira deve acontecer com a inclusão do tema Educação Domiciliar na agenda do Plano Nacional de desenvolvimento da Educação.
Em qualquer caso, se trata
de ampliar o papel do Estado. A
história mostra como os Estados cresceram e se desenvolveram justamente para
poder manter-se como continentes das demandas de suas populações e não ao
contrário.
Por estas razões pode-se afirmar que a Educação Domiciliar cumpre perfeitamente o estabelecido
na Constituição e nas leis da Educação Nacional. E que caso se entenda que
existe mesmo um vazio de legislação
a esse respeito, é necessário adaptar todos os Instrumentos de Lei para que as
famílias que por essa modalidade
optam, se sentam amparadas pelas leis e pelas instituições.
( Este é o primeiro de uma série de post sobre o tema.)
( Este é o primeiro de uma série de post sobre o tema.)
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